sábado, 22 de novembro de 2008

Como você quer ser visto no ano que vem?

A mensagem é clara. Vamos refletir em que lugar e como pretendemos nos colocar no mundo do trabalho!

Essas idéias seguem para todos aqueles que pretendem dar uma volta por cima nas frustrações de 2008 e pretendem que 2009 seja um ano de muitas realizações.

Tudo de bom a vocês meus alunos que viveram comigo a aventura do conhecimento!

Feliz Natal e um Promissor 2009. Em todos os sentidos!

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Ensaio sobre o filme O Pefurme: História de um assassino


Muitas são as análises possíveis deste filme. Neste texto deter-me-ei a algumas que penso, constituem o contexto onde toda a história de daquele que julgo ser uma espécie de “herói” – ao menos de si mesmo porque consegue seu intento ao final – se desenrola. Faço já a princípio uma pequena, mas sutil alteração no título original para o qual proponho ser: O perfume: buscando o controle sobre a paixão. Ao final espero que o leitor consiga perceber os fatos que me fizeram “brincar” com o título oficial do livro e do filme.

O livro de Patrick Suskind de 1985, transformado em filme em 2006 nos apresenta, em primeiro lugar, ao mundo da segunda metade do século XVIII na França. A vida de Jean Baptiste Grenouille se desenrola num período que antecede a Revolução Francesa, marco histórico que alterará significativamente a história da humanidade desembocando no que hoje conhecemos como o capitalismo.

Embalada na temática do filme, ou seja, um “mundo dos aromas” destaco alguns aspectos da experiência de Grenouille e tento estabelecer conexões com fatos sociais da época dando a cada um deles eles um caráter “aromático”.

Abandono - O aroma da decomposição

Jean Baptiste Grenouille nasce em 1738, numa França em decadência. Àquela época, a sociedade francesa era dividida em três estados – clero/nobreza/povo – camponeses e burgueses – e vivia um momento de profunda inquietação que antecedeu a Revolução Francesa.

Ao nascer, Grenouille enfrenta o aroma da morte e sobrevive. O aroma de uma sociedade onde ele, enquanto criança, nada valia. As mulheres da nobreza levavam seus filhos para serem amamentados por camponesas as quais abandonavam seus próprios filhos, muitos deles levados a orfanatos como os de Madame Gaillard.

Descartes, um século antes dos fatos descritos no filme, apresentava uma visão crítica da infância: “A infância é antes de mais nada fraqueza do espírito, período da vida em que a faculdade de conhecer, o entendimento, está sob total dependência do corpo.” As crianças que ainda à época de Jean Baptiste – e mesmo depois – eram consideradas estorvos e seres sem nenhuma importância, só passaram a ser uma preocupação social a partir dos anos 1760 – 1770 período em que nosso perfumista já havia consumado seu destino.

Grenouille é então um símbolo de abandono, rejeição e desprezo que marcou naquele período o destino de muitas crianças. Mãe, Madame Gaillard, Sr. Grimal, personagens fétidos de um mundo que se decompunha, de uma sociedade decadente.

Para Descartes, Jean Baptiste, certamente não seria visto como alguém que saiu da infância. Não podemos deixar de considerar que o olfato é dos sentidos, talvez o mais primitivo.

Paixão – O aroma da irracionalidade

Preso ao que tinha como um valor, seu talento único – e lembremos que talento na antiguidade era moeda de troca – Jean Baptiste, conhece Paris, um mundo de odores inexplorados.

É interessante notar seu lugar social em relação aos demais, sua postura “dócil” – um “animal” de carga. De longe sonhava com o que poderia ver, de perto mantém olhos fechados como quem não precisa ver o mundo para senti-lo. Mas Grenouille era um “animal” que pensava com a ganância típica da época. Uma ganância por odores.

É diante da loja do Sr. Pelissier, comerciante de sucesso, representante do poder social que Grenouille inala “Amor e Psique” e sente, pela primeira vez, o aroma da paixão. Em um mundo onde o perfume iniciava sua missão de disfarçar os aromas da podridão, Jean guiado por seu talento inebria-se com os feromônios da jovem ruiva. Seus bilhões de poros o conduzem para um lugar nunca antes visitado, um mundo para além das limitações, o paraíso virginal, o nirvana.

Mas é ali, naquele lugar que experimenta pela primeira vez seu poder de destruir. É ali em meio ao contato com o paraíso que, fugindo de ser identificado como alguém, reencontra a morte que marca sua vida como um ninguém. Ali, diante da morte, percebe que ela leva consigo o cheiro do que é vivo enquanto paixão.
A paixão é um sentimento combatido pelo Iluminismo Francês A razão (humana) deve dominar acima de tudo e acima de todos. Toda e qualquer atividade ou instituição que não fossem puramente racionais deveriam ser combatidas. Trava-se uma luta contra a fantasia, o sentimento, a paixão e às desigualdades sociais, porque a razão é universal. No campo social, econômico, político, religioso, tudo isto levou à demolição, à destruição da ordem constituída. O Iluminismo foi a mola racional propulsora da revolução francesa.
Grenouille é assim um anti-revolucionário que sente o aroma da paixão e, paradoxalmente, o revolucionário que a mata.

Desafio – O aroma da mudança

Grenouille, símbolo paradoxal de uma Revolução, a partir da morte da paixão propõe-se um projeto que poria fim a “sua vida infeliz”: ele aprenderia a preservar os aromas. Não poderia viver a paixão, ato irracional, mas preservá-la como perfume. Ao desafiar o decadente Baldini, Jean Baptiste deixa para trás o mundo do curtume, sai da periferia e se coloca no centro.

G.Baldini, membro da burguesia vê em Granouille a possibilidade de retomar o caminho da ascensão e a fuga da mediocridade. Sua casa que “ensaia um desabamento” mostra outro lado – talvez obscuro – do projeto burguês.

Embora ainda com status de mercadoria, Grenouille, o melhor nariz de Paris, vai aos poucos perdendo a docilidade. A jovem que o persegue no mundo dos sonhos lembra-o constantemente de seu projeto de preservar com a racionalidade das fórmulas e com a disciplina do trabalho duro aquilo que sua alma-psique não pode esquecer: a paixão.

Não conquista sua passagem para a liberdade de graça. Paga com seu talento único – aquele mesmo que Baldini afirma não ser o suficiente para ser um perfumista. Como numa maldição, mais uma vez, aquele que o trata como uma mercadoria, morre, mas na Pont au Change – a Ponte do Câmbio –, local das trocas, mudanças e transformações, somente o desabamento da casa de Baldini, alterou a paisagem.

Liberdade – o aroma da solidão

Sozinho, Grenouille opta por fugir à civilização, resolve subir ao alto das montanhas. Saído do lixo do mercado de peixes, dos fossos do curtume e do porão da loja de perfumes ele objetiva chegar ao local mais alto, a cidade dos verdadeiros perfumistas. Mas antes, pela primeira, vez quer ser livre para experimentar-se, para sentir-se.

Ao buscar tornar-se alguém importante, aquele que finalmente irá aprender a preservar o aroma da paixão, alguém com um lugar num mundo que começa a oferecer oportunidades a todos Grenouille descobre-se um ninguém. Ser, até então, ninguém para todos não tinha tido importância para ele. O sonho que revela sua invisibilidade diante da moça permite a ele perceber seu ser inodoro, sua trágica solidão. Seu fantástico talento se transforma em sua sombria vingança contra o aquele mundo que ainda não se sabia decadente.

Revolta – o aroma da morte

Grenouille, o assassino irracional e apaixonado, buscando provar que existia que era alguém excepcional, transforma-se no matador calculista. Após seu reencontro com o aroma paradisíaco a caminho de Grasse não tem outro objetivo a não ser encontrar a fórmula semelhante ao perfume encontrado em uma “tumba egípcia”.

Monta seu projeto do “perfume original”, um perfume que guarde a essência da paixão humana presente numa virgem. As virgens remetem ao divino, ao mais elevado, diferentes virgens compondo um panteão de “deusas sacrificadas” para preservar eternamente a paixão. Mas somente as virgens da nobreza têm nome: Françoise, Albine e aquela que foi para Grenouille a expressão máxima da paixão. As demais, camponesas, burguesas ou ainda membro da Igreja faziam parte do grupo dos sem nome, da massa.

A descoberta da fórmula racional de produção da essência que traria ao mundo o “perfume original” – os quatro acordes de cabeça, os quatro acordes de coração, os quatro acordes de fundo e a 13ª essência final – é feita, paradoxalmente, junto à “impureza”, uma prostituta. Na busca (ir)racional da paixão, vale qualquer estratégia.

Ignorantes do projeto, membros da sociedade pré-revolucionária, buscam um assassino que não teme a justiça social- Fórum, desafia a racionalidade cientifica – pai de Laura – e desdenha de Deus – Bispo. Uma sociedade frágil diante daquele que, mesmo sendo ninguém para todos, por meio do método da enfleurage extraía o óleo essencial das virgens.

Conquista - o aroma do vazio

Jean Baptiste atinge seu objetivo. Prova, mais para si mesmo do que para o mundo, que era capaz de produzir o “perfume original” – que podemos entender como primordial, primitivo e originário, coincidentemente feminino – um perfume para um mundo e uma sociedade que se masculinizava, que se banhava cada vez mais de racionalidade. Um mundo onde a 13ª essência vem de Laura, “a coroa de folhas de louro” que adornava a cabeça dos imperadores, ruiva de paixão, como a primeira.

Mas ao chegar lá se depara com a ausência. Ao perceber que tinha poder de controlar a tudo e a todos, que era praticamente Deus depara-se com o vazio que só pode ser preenchido com a paixão encarnada. Ao ver, pela primeira vez corpos solitários apaixonados que se completavam nas trocas tem a máxima experiência do vazio.

Para ele não há mais como conter tal descoberta. Desolado e perdido em sua racionalidade banha-se de paixão, de seu Perfume Original. A única saída para o vazio era ter, ao menos uma vez, “com-paixão”.

Retorna ao seu local de origem e ao transformar-se em alimento tem seu primeiro e único ato de amor.

Autora: Profª Dra. Rosalice Lopes